Éderson Schmitt
Texto originalmente publicado no perfil pessoal do autor no Facebook
Lá pelos idos de 2016 fiz um pequeno artigo para uma disciplina optativa do curso de Ciências Sociais. Com o tema livre – desde que tenha relação com a matéria, no caso a situação política brasileira na ocasião – escolhi tratar de analisar os discursos do movimento Escola Sem Partido (ESP) e assim relacionar com os discursos conservadores sobre a educação durante a crise nos anos 1960 no Brasil. Para isso usei o jornal Tribuna da Imprensa de propriedade de Carlos Lacerda. Meu objetivo era analisar quais eram as semelhanças e diferenças entre o “hoje” e o passado no que concerne a esse ponto.

Publicação retirada da página oficial do Escola Sem Partido no Facebook no dia 28/03/2018
Pois bem. Em linhas gerais há sim semelhanças. O discurso de doutrinação e o suposto viés ideológico da educação aparece em ambos os períodos. Ao mesmo tempo a crítica a Paulo Freire também era presente, assim como hoje. Mas também haviam diferenças. A primeira diz respeito à idade dos alunos. Se hoje o discurso do ESP se baseia basicamente na educação de crianças, em 1964 era um pouco diferente. Uma política nacional de alfabetização de jovens e adultos estava sendo elaborada e era então criticada pelo jornal conservador por seu suposto caráter ideológico. Segundo eles o Estado, na figura de João Goulart e o Ministério da Educação estavam criando um projeto para “doutrinar” os adultos para que assim pudessem se eleger novamente na eleição de 1965.
Apesar das denuncias contra a educação de adultos predominarem, a de crianças também aparecia e da mesma forma era denunciada nas páginas do jornal. Mas há um ponto crucial que difere os dois momentos.
Em 1964 a “doutrinação”, por assim dizer, tinha sua origem no aparelho estatal. Para eles o Ministério da Educação e o governo estavam em conluiou para “comunizar” o país. Os alunos e os professores seriam vítimas desse processo. Já no discurso do Escola sem Partido a lógica se inverte. São os professores que são os agentes. São eles que de forma racional irão usar seus alunos para que sejam manipulados e doutrinados. A fixação dos cartazes em sala de aula com os “Deveres do professor” se relaciona com esse ponto.

Carlos Lacerda
Para o texto não ficar muito extenso compartilharei apenas dois trechos que mostram claramente essa diferença. O primeiro é do Tribuna da Imprensa, no dia 24/01/1964 que aborda a “doutrinação” nas escolas e o segundo foi retirado do próprio site oficial do ESP.
“Finalmente, diretores de colégios particulares começaram a reunir-se para tomar as primeiras providencias para desencadear um movimento conjunto, contra os métodos de ensino no País controlados e dirigidos pelo Ministério da Educação e Cultura. Chegaram os educadores cariocas à conclusão de que não é mais possível aceitar pacificamente a comunização do ensino, através da orientação determinada pelo Ministério da Educação.”
“Os doutrinadores têm pleno conhecimento de que a reavaliação das idéias e convicções adquiridas durante a adolescência exige um investimento intelectual e emocional pesado demais para a maior parte das pessoas, de modo que a adesão a determinado credo ideológico, quando prestada durante essa fase crítica da vida, tende a prolongar-se por vários anos, quando não para sempre.”
Creio que o perigo no discurso atual é bem evidente.